No especial 70 Anos da TV, da TELA VIVA, patrocinado pela ABERT, a jornalista Edianez Parente entrevistou Melissa Vogel, CEO do Kantar Ibope Media. Veja a matéria abaixo.
“A TV passou por uma ressignificação e se adaptou a um cenário de convivência”, afirma Melissa Vogel, CEO do Kantar Ibope Media no Brasil. Para a executiva, a forma como a mídia é consumida demonstra haver hoje um telespectador cada vez mais multiconectado. O tão decantado consumo cruzado dos meios já é realidade com a TV como parte central na casa. Vale lembrar que o brasileiro consumiu em 2019 mais de 6 horas por dia de TV, volume que neste ano cresceu cerca de 1h30 por conta da pandemia.
Nesta entrevista, Melissa fala sobre os gêneros mais assistidos e como o consumidor brasileiro de TV vem conversando e levando os assuntos para os outros meios digitais. Ela também aborda a discussão atual sobre o lançamento de uma ferramenta capaz de aferir o consumo multiplataforma.
TELA VIVA – O ano 70 da TV brasileira acontece em pleno período da pandemia do coronavírus. Como este ano atípico está se refletindo no consumo de TV pelo público, com mais gente em casa assistindo ao meio? Isso denota alguma mudança em relação ao que vinha se notando no consumo do meio nos últimos anos? É possível detalhar?
Melissa Vogel – Sem dúvida nenhuma estamos vivendo uma situação sem precedentes, que implica em mudanças profundas no comportamento em diversos aspectos. O tempo que o brasileiro passa assistindo à TV já é mais do que o dobro da média mundial. Enquanto no mundo o consumo fica em torno de 2h55, no Brasil chegava a 6h17 no ano passado. Com o avanço da pandemia, as pessoas passaram a ficar mais tempo dentro de casa e isso impactou diretamente nas audiências dos meios, tendo a TV e o rádio como destaques. O consumo de mídia e a forma como ela é consumida, mais especificamente, demonstra que o consumidor está cada vez mais multiconectado, com consumo cross media. Em geral, vemos que a pandemia foi um momento no qual as pessoas passaram a experimentar mais com o digital. Vimos isso no consumo de TV online, no VOD, bem como de rádio e outras mídias como redes sociais, podcasts etc.
Observamos um aumento considerável na audiência de televisão após o início das medidas de isolamento social, principalmente em março e abril, e agora, embora estável, segue em patamares semelhantes a períodos anteriores à pandemia. O principal impulsionador desse aumento inicial foi o crescimento do tempo médio que cada pessoa passou assistindo à TV, que chegou a cerca de 8h diárias entre 23 e 29 de março, 1h30 a mais do que a média na semana que antecedeu a pandemia (2 a 8/3). Esse crescimento na audiência de TV favoreceu alguns gêneros, como jornalismo e entretenimento, já que a busca por informações se fez cada vez mais necessária, ao mesmo tempo em que também é importante termos momentos de lazer. Entre as 20 maiores audiências de TV dos últimos cinco anos, 13 foram registradas em março, no início das medidas de distanciamento;
A repercussão não se limita aos números de audiência: o aumento das conversas sobre a programação de TV nas redes sociais, em especial comentando notícias e reportagens, também aumentou. O Jornalismo passou da 5ª posição entre os gêneros mais comentados no Twitter para a vice-liderança, perdendo apenas para os Reality Shows. Ou seja, a TV se manteve parte das nossas conversas diárias. O que podemos dizer com certeza é que o brasileiro sempre gostou de TV, e esse foi um hábito reforçado e que agora ganha cada vez mais telas e formatos.
TELA VIVA – Como o consumo de TV está se relacionando com as demais mídias, de acordo com as aferições da KantarIbope Media? É possível delinear, de uma forma geral, como se dá a atual convergência dos meios (TV + internet + streaming + VOD etc)?
Antes de falar de integração, temos que pensar no que o consumidor quer e gosta. O conteúdo em vídeo, por exemplo, assumiu um protagonismo na vida dos brasileiros, sendo consumido por 99% da população. Aqui estamos considerando todos os formatos de transmissão: TV aberta, TV por assinatura, websites, app de mensagens, on demand, streaming e vídeos gratuitos na internet… E para esse formato, a TV tem um lugar especial pela sua abrangência, já que está presente em quase todas as casas no Brasil, impactando 90% dos brasileiros. Nesse momento sem paralelo, a TV reforçou seu papel de companhia para muitas pessoas. Não é à toa que, na busca pela informação em relação ao novo coronavírus, a TV aparece como o meio mais confiável para 79% da população. Mas o consumo de mídia já vem acompanhando uma revolução tecnológica nos últimos anos e muitos hábitos foram acelerados pela pandemia.
Entre abril e maio fizemos uma onda online especial do Target Group Index para entender o consumo e sentimento das pessoas nesse momento tão único, afinal vivemos em um país extremamente heterogêneo e a pandemia afetou as pessoas de forma completamente diferente. Nesse levantamento, 56% das pessoas afirmaram que passaram a adotar melhor a tecnologia ao longo do dia a dia, 66% viram mais vídeos online (gratuitos) e 56% viram mais vídeo sob demanda (pago). Ou seja, houve uma intensificação de um estilo de vida mais digital e, como mencionei antes, o consumo de mídia e a forma como ela é consumida, é cada vez mais multicanal.
O consumidor é onipresente e consome em diversos meios: nosso levantamento mostra que 48% das pessoas intensificaram o consumo de mídia em, pelo menos, quatro meios neste período de pandemia. Está sendo um momento de experimentação do consumo de mídia. O VOD, por exemplo, segue em crescimento e quem se destacar agora ficará em posição privilegiada, seja por meio de promoções, combos ou conteúdo exclusivo e diversificado. O uso do mobile deve se intensificar ainda mais, com o surgimento de novos apps que ganharam relevância e devem ser incorporados à nossa rotina. O ser humano conectado é uma realidade e os produtores de conteúdo de TV, ao entenderem esse novo comportamento, passaram a ser mais atuantes também em canais digitais. Ou seja, não é sobre concorrência. É sobre ter opções de informação e entretenimento num momento tão único para a população. As plataformas são, cada vez mais, integradas.
TELA VIVA – Quais os tipos de formatos mais consumidos em televisão (informação, entretenimento, eventos ao vivo etc)?
Os conteúdos variam bastante. De acordo com nossa medição de audiência, os gêneros mais assistidos pelos brasileiros são Novela, Auditório, Show, Game Show e Jornalismo. É importante ressaltar também a importância do conteúdo ao vivo e inédito na programação de TV, que é muito relevante para o engajamento com a audiência dos programas jornalísticos, esportivos e reality shows. Esses conteúdos são baseados em emoção, na experiência de ser o primeiro a se informar, a vibrar, a fazer parte. Esse sentimento também vale para as séries e novelas, que a cada novo capítulo prendem a atenção do telespectador. É a sensação de fazer parte daquela transmissão.
TELA VIVA – A medição da audiência em TV por assinatura foi um marco do início dos anos 2000 no Ibope. Nesta nova década (anos 2020), a influência das redes pode ser igualmente decisiva para estudos de audiência? Como se dá esse cruzamento de dados de consumo (TV e redes sociais)?
Sem dúvida. As conversas geradas nas redes sociais sobre o que se é visto na TV ganham cada vez mais espaço. Costumamos dizer que o consumidor assiste à TV com os olhos em várias temas e com o smartphone na mão. De acordo com a nossa solução KSTR, que avalia o buzz dos programas de TV nas redes sociais, as conversas sobre conteúdo em vídeo atingiram 21 bilhões de impressões no Twitter ao longo de 2019. A TV segue dominando os assuntos na rede, com 15 vezes mais impactos do que os conteúdos de streaming e on demand.
O fenômeno da Social TV, a interação e geração de conteúdo entre TV e redes sociais, também permite avaliar se a audiência dos programas de TV engaja com as marcas que foram expostas na programação, métrica importante tanto para anunciantes e agências nas suas decisões de investimento quanto para as emissoras defenderem suas cotas de patrocínio se apoiando também na repercussão digital.
TELA VIVA – Na sua avaliação, qual será a próxima onda das ferramentas digitais influenciando o consumo da mídia TV?
A TV é a tela central da casa e serve como centro de comando para tantas outras atividades: para se informar, torcer pelo clube ou atleta favorito, ir ao cinema, realizar compras, entrevistar o influenciador favorito, jogar com as amigos e até ir pro show. A TV passou por uma ressignificação e se adaptou a um cenário de convivência com outras plataformas, respeitando o contexto e a necessidade do consumidor, aproveitando-se do interesse e da interatividade, como um teaser inédito em TV aberta que continua no streaming, um QR code durante a exibição de uma live ou reality show, permitindo doações e compras instantâneas, promoções anunciadas ao vivo e disponíveis em primeira mão em aplicativos etc.
Além disso, como mencionei anteriormente, esse atual cenário fez com que as pessoas passassem a experimentar mais com o digital, com um consumo expressivo de TV online, VOD, bem como de rádio e outras mídias como redes sociais, podcasts etc – e todos esses conteúdos também podem ser acessados pela TV. A posse de SmarTVs chega a 49% no Brasil. O Dimension, que é nosso estudo global sobre a percepção dos consumidores em relação a publicidade e conteúdo, já mostrava que a força da TV segue predominante nos principais mercados do mundo e que o conteúdo em várias telas agora é uma atividade comum: 77% desses consumidores conectados também consomem conteúdo por meio de device conectado à TV, e 83% (chegando a 95% na faixa de 18 a 34 anos) fazem isso por meio de um site ou aplicativo.
E é de olho nesse cenário que entendemos a necessidade de implementar um projeto que possibilitasse a evolução no entendimento de todo do consumo de vídeo. O CMAM, Cross Media Audience Measurement, é a nossa solução que permitirá a mensuração do consumo de vídeo e planejamento de mídia nas mais diferentes plataformas e devices. A tecnologia do CMAM já é utilizada pela Kantar em outros países e sua adoção no mercado brasileiro está sendo discutida junto aos players da indústria.
TELA VIVA – A TV aberta se viabiliza primordialmente por meio da publicidade. Qual a influência do vídeo comercial no público de TV atualmente e qual o interesse que desperta? E na TV fechada?
O conteúdo em vídeo é consumido por 99% dos brasileiros, seja na TV aberta, na internet, no whats app etc. O vídeo faz parte do dia a dia da população e segue se adaptando ao contexto do consumidor. Com a publicidade não é diferente, à medida que novos formatos oferecidos pelos veículos também evoluem com esta nova realidade, integrando novas soluções com os formatos consolidados como os pacotes de patrocínios, spots nos intervalos comerciais e soluções de branded content.
Cada vez mais, as marcas estão descobrindo na TV uma nova experiência de interatividade. A ressignificação do meio é constante e se reflete nos conteúdos disponibilizados em vídeo em diversas plataformas. Por exemplo, dados do Target Group Index indicam que 29% dos entrevistados pesquisam na internet informações sobre os produtos anunciados durante a programação. O que aconteceu durante o período de explosão das lives multiplataforma exemplifica esta realidade. Fizemos um levantamento especial entre abril e maio, e das 64 lives analisadas, 60 tiveram algum tipo de ação, com destaque para as marcas de cerveja, meios de pagamentos digitais e varejo. Essa estratégia por parte das marcas tem tudo para dar certo e se tornar uma tendência daqui para frente. O uso dos QR codes também foi ampliado e popularizado e a TV pode agora explorar sua vocação interativa e digital.
Enfim, o que tudo isso mostra é que cada vez mais os produtores de conteúdo, as plataformas de mídia, as agências e os anunciantes precisam trabalhar em conjunto para desenvolver soluções e formatos inovadores para engajar consumidores e os conectar às marcas de forma criativa e eficiente.
Clique em 70 Anos da TV Aberta no Brasil e conheça mais sobre o projeto que apoiamos a TELA VIVA.